quinta-feira, 14 de abril de 2016

Não tenho tempo

Todos reclamamos da falta de tempo. Parece que o dia encurtou, não tem mais 24 horas. Ou então, que essas 24 horas já não são mais suficientes.
Há aquele brocardo segundo o qual `se queres que alguma coisa seja feita, peça a alguém que não tenha tempo'. Ou seja: quanto mais ocupada a pessoa, mais tempo ela arranja para fazer as coisas. Como se explica esse milagre?

Normalmente, a modorra é contagiante. Basta que fiquemos algumas horas ou alguns dias sem fazer nada, para dar ainda mais vontade de nada fazer. Daí é um passo para a depressão e para os males que provém do ócio e da cabeça vazia.
Domenico de Masi, educador italiano, recomenda o ócio. Ócio criativo, segundo ele. Na verdade, ócio é nada fazer e, todavia, no caso, o que ele propõe é fazer algo: é parar para criar, para permitir-se os vôos da alma, para aprender a pensar.

Um dos grandes males da atualidade é o enfado.
As pessoas procuram encher sua vida com bastantes afazeres porque sentem um grande enfado quando têm algum tempo disponível. Na verdade, não sabem como aproveitá-lo.
Estamos desaprendendo o pensar criativamente, o pensar retamente, o sentir prazer em aprender ouvindo nosso interior.

O enfado é ainda maior quando a pessoa se aposenta ou diminui repentinamente o seu ritmo de trabalho e constata que não se preparou convenientemente para ocupar de forma útil o seu tempo.
Tem sentido, portanto, a afirmativa de que "o ócio feliz não é o permanente e final, mas sim aquele que se desfruta nos intervalos da luta pela vida e que valoriza o dolce far niente".

Alguns dizem que o sentido da vida é fazer o que se gosta. Poucos já pararam para refletir em que é mesmo que gostariam de ocupar o seu tempo, se pudessem dele dispor de forma integral.
Muitos alegam não ter tempo, mas em verdade não querem verdadeiramente ter tempo, porque não saberiam o que fazer com ele. Como não treinamos simplificar a existência, vamos entulhando a nossa vida com coisas que exigem ser mantidas. Como afirma Lia Diskin, na revista Planeta Meditação nº 11 p.21, "quanto mais coisas tenho, mais tempo tenho de dedicar a elas. As coisas se tornam usurpadoras do meu tempo!".

Sempre que queremos algo, nós achamos tempo, porque `tempo é prioridade' e se queremos realmente alguma coisa, nós a colocamos como prioridade.
Ouvir as pessoas é fascinante. Ouvir atentamente, olhando nos olhos, esperando o momento certo para falar com calma e ponderação, sem querer se impor ao interlocutor. 

Assim, é importante que nos disciplinemos e que passemos a organizar melhor a vida, procurando administrar sabiamente o nosso tempo, para fazer não apenas as coisas urgentes como também as importantes e não perder, jamais, a perspectiva de que há que existir um equilíbrio entre as quatro necessidades humanas fundamentais (físicas, sociais, mentais e espirituais), merecendo, todavia, maior atenção aquela que trata do nosso ser imortal.

Com o pretexto de que estamos sempre precisando aumentar a nossa renda, vivemos cumulando afazeres para ganhar mais, para possuir mais, para nos preocupar mais, e tudo isso para quê?

O livro "First Things First – ensina como definir prioridades num mundo sem tempo", de Stephen Covey, lançado no Brasil pela Editora Campus.
Nele, entre outras coisas, o autor nos ensina que "a administração tradicional do tempo lida com o cronos, palavra grega que significa o tempo medido pelo relógio. Cronos é o tempo linear e em sequência é ele quem dita o ritmo de nossas vidas. Mas existe outra maneira de abordar a vida: kairos. Aqui o tempo passa a ser algo que é vivido, algo do qual se tira valor. Quando perguntamos "você passou bem o seu dia?" não estamos nos referindo ao tempo linear daquele dia, mas à qualidade desse tempo. Ou seja: kairos é o tempo qualitativo".

Outro autor, o filósofo Jacob Needleman, na sua interessante obra "O tempo e a alma", da Ediouro, mostra que o tempo é a maior carência do homem moderno. Somos escravos do tempo e, ao mesmo tempo, pobres dele. Coisas que se costumava considerar como sinais de sucesso ser ocupado, ter muitas responsabilidades, estar envolvido em muitos projetos ou atividades. Hoje representam aflições', diz ele.

É preciso encontrar a medida certa. O homem comum só a encontra depois de muito penar e refletir. O homem de senso moral mais amadurecido a encontra por intuição.
Ainda somos criaturas muito imperfeitas, querendo sorver a vida de um gole só, nesse espaço que medeia entre a sexta e a segunda-feira.

Ainda não descobrimos o prazer da atividade diária bem dosada, com pausa para a reflexão, para observar as nossas atitudes diante da vida, procurando melhorar a qualidade do nosso tempo, para `ficar com a melhor parte', como recomendou Jesus, na passagem registrada por Lucas, no seu Evangelho:
"Marta, Marta! Andas inquieta e te preocupas com muitas coisas; entretanto, uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte e esta não lhe será tirada."

Vivemos reclamando da falta de tempo, atropelando compromissos e superlotando cada vez mais as nossas agendas, sem a preocupação de estabelecer prioridades e de viver com intensidade aquilo que estamos a fazer no momento. 

Cuidemos dos nossos afazeres, um a um, cuidemos melhor da qualidade do nosso tempo, de engolir tanta informação sem conseguir analisar, de ler, ver tantas coisas absolutamente inúteis, de viver sem selecionar os nossos pensamentos, apenas porque a maioria das pessoas `normais' também fazem isso.
Se conseguirmos fazer essa mudança, o tempo terá aumentado significativamente.

Texto adaptado
Autor: Noeval de Quadros
Créditos: G E Casa do Caminho de S.Vicente

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